Nada melhor que começar botando os pingos nos is. Eu não sou um apoiador do Bolsonaro. Pelo contrário, esse é um texto escrito por alguém que o considera uma das últimas opções dentro do leque de presidenciáveis. Alguém que, num fatídico segundo turno entre Bolsonaro e Lula, ficaria seriamente tentado a votar na "alma mais honesta do país".
Mas este também não é o texto sobre o que eu desejo que aconteça, mas sobre o que eu acredito que vai acontecer. E os sinais indicam que Bolsonaro tem tudo pra realmente ser o Donald Trump brasileiro, só que por motivos completamente diferentes do que a galera que fica chamando ambos de fascista acredita.
As similaridades entre os dois são muito mais profundas que as críticas repetidas exaustivamente de machista, racista, homofóbico. Muito mais importantes que o diagnóstico raso de que representam "o ódio das elites golpistas" e aquela ladainha toda. Mas podem ser resumidas em um ponto central que pode ser chocante para todos:
Calma. Respira fundo. É isso mesmo que eu escrevi. Prometo que vai fazer sentido se você continuar lendo. Vamos lá.
Eu sei que você acredita que a esquerda é a única, verdadeira e legítima representante do povo. Eu também acreditava. Quase todo mundo que passou pelo ensino médio ou superior nos anos 90-00 pensa assim. Mas vamos parar pra analisar um pouquinho.
Imagine que você é um membro do mítico povão.
Você acorda cedo, rala pra caramba pra sobreviver com o seu salário. Volta pra casa em ônibus lotado, um caldeirão de gente se acotovelando. Morre de medo de ser assaltado todo dia. Passa por um tiroteio no caminho de casa, e a única segurança que sente é a fé que tem em Jesus (e a confiança de que está com o dízimo em dia). Quando finalmente chega em casa, tudo que você quer é relaxar assistindo o futebol e a novela.
O que a essa esquerda moderna tem a dizer sobre você?
Que você é tudo que ela odeia. Que você é um imbecil por acreditar em deus, um alienado por assistir a Globo, um reacionário maldito por ter medo de bandido. Que você é machista por gostar de ver a dançarina rebolando no Faustão, e ao mesmo tempo homofóbico por não gostar do clipe do Pablo Vittar. E além de machista e homofóbico, você também é racista, fascista, transfóbico, heteronormativo e mais um monte de outros palavrões sofisticados que você não sabe nem pronunciar.
Do alto de sua torre de marfim, certos intelectuais de esquerda idealizaram um pobre que só existe na mente deles - um pobre que está muito preocupado com apropriação cultural, islamofobia, agricultura orgânica, laicidade do Estado e veganismo. Essa enorme elite burguesa - quase sempre sustentada por dinheiro de impostos cobrados de você - está lá, falando palavras difíceis e preocupada com temas completamente alheios ao seu dia-a-dia, enquanto fala mal de tudo que você gosta e te chama de idiota.
E o pior de tudo, petulância das petulâncias: ela acredita que te representa.
A esquerda fala muito de alienação mas, de tão alienada em si mesma, se convenceu de que representa os pobres. Nada mais longe da verdade. Na verdade, ela não tem o menor interesse de representar, mas sim de controlar os pobres. A esquerda ama o pobre no mesmo jeito que alguém ama seu bichinho de estimação - eu te dou comida e limpo seu cocô, em troca você me deve lealdade e obediência eternas.
Eis que chega um Trump. Eis que chega um Bolsonaro.
Eles não querem ditar o que você deve pensar. Pelo contrário, parecem dar voz ao que você pensa. Eles não estão preocupados com a ararinha azul ou com a representatividade trans-quilombola no congresso, mas com os seus problemas reais.
Finalmente um político promete prender o bandido que roubou o celular que você ainda está pagando prestação, em vez de dizer que ele é uma vítima da sociedade que precisa de carinho. Finalmente um político que fala de Jesus, em vez perseguir o cristianismo e proteger o islã. Finalmente um político que promete acabar com a boca de fumo que destruiu a vida do seu filho, em vez de falar de legalizar a maconha. Finalmente o seu Zé, dono do botequim da esquina, vê um político que o reconhece como um empreendedor que rala pra caramba, e não como um empresário malvadão explorador.
Não é questão de eu concordar ou não com essas pautas. Como quem me conhece sabe, eu sou um ateu, defensor da laicidade, do aborto, da legalização das drogas, e da igualdade de direitos. Mas eu também sou só mais um burguesinho na minha torre de marfim.
O fato é que esses políticos estão realmente alinhados com os anseios do povão e isso, no Brasil e no mundo atuais, é uma raridade.
É por isso que eu acredito que as chances do Bolsonaro pra 2018 são muito grandes. E quanto mais a "elite intelectual" espernear bordões como machista, fascista, homofóbico, mais aumentarão as suas chances. Porque, ao contrário deles, Bolsonaro de fato representa o povão. E ao xingar o Bolsonaro pelo que ele acredita, estão indiretamente xingando - e antagonizando - o povão.
(publicado originalmente em dezembro/2017)